Jung
Explica a Sincronicidade
(continuação)
Todos os fenômenos a
que me referi podem ser agrupados em três categorias:
1. Coincidência de um
estado psíquico do observador com um acontecimento objetivo externo e
simultâneo, que corresponde ao estado ou conteúdo psíquico (p. ex., o
escaravelho), onde não há nenhuma evidência de uma conexão causal entre o
estado psíquico e o acontecimento externo e onde, considerando-se a
relativização psíquica do espaço e do tempo, acima constatada, tal conexão é
simplesmente inconcebível.
2. Coincidência de um
estado psíquico com um acontecimento exterior correspondente (mais ou menos
simultâneo), que tem lugar fora do campo de percepção do observador, ou seja,
especialmente distante, e só se pode verificar posteriormente (como p. ex. o
incêndio de Estocolmo).
3. Coincidência de um
estado psíquico com um acontecimento futuro, portanto, distante no tempo e
ainda não presente, e que só pode ser verificado também posteriormente.
Nos casos dois e três,
os acontecimentos coincidentes ainda não estão presentes no campo de percepção
do observador, mas foram antecipados no tempo, na medida em que só podem ser
verificados posteriormente. Por este motivo, digo que semelhantes
acontecimentos são sincronísticos, o
que não deve ser confundido com "sincrônicos".
Esta visão de conjunto
deste vasto campo de observação seria incompleta, se não considerássemos aqui
também os chamados métodos mânticos. O manticismo tem a pretensão, senão de
produzir realmente acontecimentos sincronísticos, pelo menos de fazê- los
servir a seus objetivos. Um exemplo bem ilustrativo neste sentido é o método
oracular do I Ging que o Dr. Helmut Wilhelm descreveu detalhadamente neste
encontro. O I Ging pressupõe que há uma correspondência sincronística entre o
estado psíquico do interrogador e o hexagrama que responde. O hexagrama é
formado, seja pela divisão puramente aleatória de 49 varinhas de milefólio,
seja pelo lançamento igualmente aleatório de três moedas. O resultado deste
método é incontestavelmente muito interessante, mas, até onde posso ver, não
proporciona um instrumento adequado para uma determinação objetiva dos fatos,
isto é, para avaliação estatística, porque o estado psíquico em questão é
demasiadamente indeterminado e indefinível. O mesmo se pode dizer do
experimento geomântico, que se baseia sobre princípios similares.
Estamos numa situação
um pouco mais favorável quando nos voltamos para o método astrológico, que
pressupõe uma "coincidência significativa" de aspectos e posições
planetárias com o caráter e o estado psíquico ocasional do interrogador. Ã luz
das pesquisas astrofísicas recentes, a correspondência astrológica
provavelmente não é um caso de sincronicidade mas, em sua maior parte, uma
relação causal. Como o prof. KnolI demonstrou neste encontro, a irradiação dos
prótons solares é de tal modo influenciada pelas conjunções, oposições e
aspectos quartis dos aspectos que se pode prever o aparecimento de tempestades
magnéticas com grande margem de probabilidade. Podem-se estabelecer relações
entre a curva das perturbações magnéticas da terra e a taxa de mortalidade —
relações que fortalecem a influência desfavorável de ☌,☍,☐, [aspectos
quartis] e as influências favoráveis de dois aspectos trígonos e sextis. Assim
é provável que se trate aqui de uma relação causal, isto é, de uma lei natural
que exclua ou limite a sincronicidade. Ao mesmo tempo, porém, a qualificação zodiacal
das casas, que desempenha um papel no horóscopo, cria uma complicação, dado que
o Zodíaco astrológico coincide com o do calendário, mas não com as constelações
do Zodíaco real ou astronômico. Estas constelações deslocaram-se
consideravelmente de sua posição inicial em cerca de um mês platônico quase
completo, em consequência da precessão dos equinócios desde a época do 0º
[ponto zero de Áries] (em começos de nossa era). Por isto, quem nascer hoje, em
Aries, de acordo com o calendário astronômico, na realidade nasceu em Pisces.
Seu nascimento teve lugar simplesmente em uma época que hoje (há cerca de 2.000
anos) se chama "Áries". A Astrologia pressupõe que este tempo possui
uma qualidade determinante. É possível que esta qualidade esteja ligada, como as
perturbações magnéticas da Terra, às grandes flutuações sazonais às quais se
acham sujeitas as irradiações dos prótons solares. Isto não exclui a
possibilidade de as posições zodiacais representarem um fator causal.
Embora a interpretação
psicológica dos horóscopos seja uma matéria ainda muito incerta, contudo,
atualmente há a perspectiva de uma possível explicação causal, em conformidade,
portanto, com a lei natural. Por conseguinte, não há mais justificativa para
descrever a Astrologia como um método mântico. Ela está em vias de se tornar
uma ciência. Como, porém, ainda existem grandes áreas de incerteza, de há muito
resolvi realizar um teste, para ver de que modo uma tradição astrológica se
comportaria diante de uma investigação estatística. Para isto, foi preciso
escolher um fato bem definido e indiscutível. Minha escolha recaiu no
casamento. Desde a antiguidade a crença tradicional a respeito do casamento é
que este é favorecido por uma conjunção entre o Sol e a Lua no horóscopo dos
casais, isto é, ′ com uma órbita de 8º em um dos parceiros, e em ☌ com ☾
no outro parceiro. Uma segunda tradição, igualmente antiga, considera ☾☌
☾também
como uma característica do casamento. De importância são as conjunções dos
ascendentes com os grandes luminares.
Juntamente com minha
colaboradora, a Dra. L. Frey-Rohn, primeiramente procedi à coleta de 180
casamentos, ou 360 horóscopos individuais , e comparamos os 50 aspectos
astrológicos mais importantes neles contidos e que poderiam caracterizar um
casamento, isto é, as ☌ (conjunções) e ☍ (oposições) entre ☉ (Sol), ☾
(Lua), ♂ (Marte), ♀ (Vênus), asc. e desc.
O resultado obtido foi um máximo de 10% em ☉☌☾. Como me informou o
Prof. Markus Fierz, que gentilmente se deu ao trabalho de calcular a
probabilidade de meu resultado, meu número tem a probabilidade de cerca de
1:10.000. A opinião de vários físicos matemáticos consultados a respeito do
significado deste número, é dividida: alguns acham-na considerável, outros
acham-na questionável. Nosso número parece duvidoso, na medida em que a
quantidade de 360 horóscopos é realmente muito pequena, do ponto de vista da
Estatística.
Trecho extraído do livro: Sincronicidade – Carl
Gustav Jung